28 de julho de 2006

Uma carta

Sr. Príncipe dos Baloiços:

Talvez não devesse escrever-te assim de surpresa! Talvez... A verdade é que não me tenho reconhecido: já não encontro as dúvidas (quase não me lembro de algum dia as ter tido). Os meus dias são agora recheados de momentos marcados por um coração acelerado que se quer abrir, e começo a sentir-me esvaziada de forças que consigam parar estas palavras gritadas em murmúrios cada vez mais agudos.
Já passou algum tempo… mais lentamente do que eu previ, mas passou! Preciso confessar-te que tenho riscado todos esses dias num calendário pequenino que levo sempre comigo, junto às fotografias de que sou inseparável. Marquei a vermelho os dias difíceis e gosto de os apagar, um a um, dia após dia a preto (para que não se veja o vermelho da dificuldade…). À medida que o preto das saudades vai crescendo vou ficando esbatida num preto e branco que me lembra que é tudo passado!! Mas o vermelho ainda domina e o presente mostra-se longo… O futuro avista-se, mas distante, imprevisível, angustiante.
Esta noite não estou a conseguir dormir… facto que começa a tornar-se preocupante porque são 5 horas e para amanha tenho muitos planos (que vão precisar de todas as horas)! Desde que voltei do cinema não consigo parar a tempestade de pensamentos que me cruza o olhar e me tolda a coordenação. Pequenas frases simples, acompanhadas de uma paisagem inspiradora que me enche o olhar de uma lado ao outro da tela, despertam pensamentos sentidos até a ponta dos dedos. Como incendiárias sem escrúpulos ateiam um sem fim de chamas que se sucedem numa cadência angustiante que não me deixa dormir.
“E se for tarde demais?” Argh! o Futuro…
Agarro o mp3, visto o casaco de malha (cor-de-rosa) e vou para o lugar que me tem servido de refúgio à maré agitada de pensamentos que tem assolado a minha costa. Sinto-me estranhamente leve: não tenho dúvidas e isso deixa-me confusa. Duvido da minha falta de dúvidas. Nunca me apeteceu, como hoje, rodopiar no meio da rua e gritar bem alto o que me preenche (tão levemente) a alma. Sinto-me tão leve que quase duvido ter alma! Nunca tive tanta vontade… tanta saudade.
Sento-me num baloiço e imagino-te ao meu lado. O balanço doce do meu corpo combina-se com a leveza da minha alma e vou sonhando com todas as palavras que tenho guardado para ti. Guardo-as como a um tesouro precioso, o mais precioso que alguma vez pude tocar.
A frescura do ar nocturno lembra-me as noites frias e húmidas, partilhadas nestes mesmos baloiços. Daqui as estrelas são ofuscadas pelo brilho do candeeiro que me habituei a ver reflectido nos teu olhar. Saudades… Saudades das estelas vistas da tua varanda de onde ”sem nevoeiro, podes ver o mar”. Saudades de tentar coordenar o meu balanço com o teu. Saudades dos meus gestos desajeitados na tua presença. Saudades da tua voz. Saudades das tuas risadas de piedade pelas insanidades que digo às horas tardias. Saudades do último beijo de despedida.
Saudades de te ouvir dizer o meu nome.
“E se for tarde de mais?”.
E se a consciência desta leveza for demasiado pesada para o meu futuro?

PS1 - bah..... mas eu não disse que não tinha dúvidas?
PS2 - hoje dei por mim com dois relógios: os mesmo minutos, mas horas diferentes!
tua,
Sílvia

2 de julho de 2006

Sabes...

 
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